Padre Georg: "Minha vida dividida entre dois Papas"
23-10-2013 11:24
Tradução: Pe. Rafael, CSsR.)
Franca Giansoldati
Jornal "Il Messaggero"- 22.10.2013
Ele faz um trabalho inédito: cuidar de dois papas ao mesmo tempo , Francisco e Joseph Ratzinger, não é algo que acontece todos os dias. Dom Georg Gaenswein, ex-secretário particular do Papa Bento XVI e agora Prefeito da Casa Pontifícia é a homem que serve de ponte, a memória histórica dos dias da renúncia, a conexão entre o velho e o novo. Mas dai a falar que está ocorrendo uma "revolução", ele diz que seria "enganador".
Ele diz isso porque crê que a revolução já tinha começado antes. De batina preta, "padre George", como eles o chamam na cúria, usa uma cruz de prata simples ("é o Ano da Fé com o brasão do Papa Bento XVI para trás"), algo feito ali perto do Rio Tibre, caracterizado a simplicidade .
É complicado trabalhar para dois Papas ?
Vamos dizer que é um grande desafio, independentemente da quantidade de coisas para fazer. Há momentos, que penso em pedir um conselho ao meu predecessor, mas não existe, porque ninguém, antes de mim, tinha feito essa dupla tarefa. No entanto, com bom senso, eu faço o meu melhor. Eu coloquei em prática as palavras do Papa Francesco: nunca fechar em si mesmo e não ter medo, por isso todos os dias eu ando sereno pelo caminho. Antes a atenção era para Bento XVI, agora é, obviamente, para Francisco, mas no final o serviço é feito para o Senhor e para a Igreja. Admito, no entanto, ter tido alguma dificuldade, alguma experiência desagradável em relação a incompreensões e inveja, mas em relação a isso, as ondas se acalmaram um pouco.
No Vaticano, não há o risco de ter um papa e um antipapa?
Nem um pouco. Há um Papa reinante e o Papa Emérito. Quem conhece Bento XVI sabe que esse perigo não existe. Ele nunca interferiu e não interfere no governo da Igreja, não faz parte do seu estilo. O teólogo Ratzinger, também sabe que cada palavra sua poderia atrair a atenção do público, e tudo o que ele dissesse iria ser lido ou a favor ou contra o seu sucessor. Portanto, não intervém publicamente. Felizmente entre ele e Francisco existe uma relação de sincera estima e afeição fraternal.
Como vive Ratzinger fechado no convento na colina do Vaticano?
Está bem. Ele reza, lê, ouve música, dedica-se à correspondência, que é grande, e há também visitas. Fazemos, todos os dias, uma caminhada juntos no bosque atrás do mosteiro para recitar o rosário. O dia é bem planejado.
A renúncia dele foi uma surpresa também para o senhor?
Não inteiramente. Eu sabia há algum tempo da decisão, mas eu nunca falei com ninguém. O momento do anúncio, em 11 de fevereiro, permanecerá indelével. Após 28 de fevereiro, começaram os dias difíceis, depois que partimos do Vaticano. Eu nunca vou esquecer do momento em que desliguei as luzes do apartamento pontifício, com lágrimas nos olhos. Em seguida, a ida de carro para o heliporto, o vôo até Castel Gandolfo, a chegada, a última despedida de Bento XVI na varanda e, finalmente, o fechamento da porta do Palácio. Durante todo o mês de março foi difícil, porque ninguém sabia quem seria eleito no conclave. Felizmente, com o novo Papa criou-se, imediatamente, uma relação humana de afeto e estima, apesar de Bento e Francisco serem pessoas com diferentes estilos e personalidades. Alguém já quis interpretar essas diferenças levassem em direções opostas. Mas não é assim.
Em que consiste a Igreja pobre de São Francisco?
Eu estou tentando entender cada vez mais o que significa. Uma coisa parece clara: a expressão " Igreja pobre" tornou-se um traço comum no ministério petrino do Papa Bergoglio. Mas em primeiro lugar, não é uma expressão sociológica, mas teológica. No centro está o Cristo pobre e daí tudo se segue. Sem dúvida, essa realidade toca o estilo de vida de cada cristão, requer uma atenção especial para o sofrimento dos doentes e dos pobres, no sentido estrito. Se dermos uma olhada no passado, vamos ver que o papa Francisco está fazendo em Roma o que ele havia feito, anteriormente, em Buenos Aires. Ele não mudou sua linha nem o seu estilo . Se existe qualquer coisa de especial, a questão é outra.
Qual?
Ele, com seu exemplo pessoal, dá a todos um testemunho valioso. O exemplo pessoal é um método pastoral.
E a revolução que está ocorrendo?
Falar em revolução parece-me um slogan fácil que alguns meios de comunicação tem o prazer em anunciar. Claro que alguns gestos e iniciativas Papa Francisco causou surpresa e ainda surpreende. Mas é normal que uma mudança de pontificado traga mudanças em diferentes níveis. O novo Papa deve, necessariamente, formar uma equipe com pessoas de sua confiança. Mas isto não é uma revolução, é simplesmente um ato de governo e de responsabilidade.
Enquanto isso, os oito cardeais estão estudando reformas...
É claro que a instituiçao deste grupo foi uma grande surpresa, uma de muitas. Mas, para olhando bem, é da responsabilidade dos cardeais a tarefa de serem os primeiros assessores do pontífice. Os cardeais se reuniram pela primeira vez no início deste mês, e terão outras reuniões. Eu acho que é muito cedo para querer resultados definitivos. Isso leva tempo. Antes do resultado, há uma fase de reflexão , discussão, aprofundamento. Confesso que estou curioso para ver o que vai sair desse processo.
A racionalização também irá resultar em cortes de pessoal ?
Talvez devêssemos deixar claro alguns termos. O que queremos dizer quando falamos de racionalização? É óbvio que a Santa Sé tem responsabilidade para com todos aqueles que trabalham em departamentos diferentes. Racionalizar é uma palavra que requer uma explicação, caso contrário não tem sentido (...).
É verdade que o Papa Ratzinger foi mantido sem saber da expulsão de Gotti Tedeschi do IOR ?
Eu me lembro daquele momento. Foi em 24 de maio. Naquele dia, houve também a prisão de nosso assessor da Casa Paulo Gabriel. Ao contrário do que se pensa , não há conexão entre os dois eventos, mas sim apenas uma infeliz coincidência, mesmo que diabólica. Bento XVI, que tinha chamado Gotti para o IOR com o propósito de continuar a política de transparência, ficou surpreso, muito surpreso com o ato de desconfiança em relação ao professor. O Papa admirava e e queria bem, mas por respeito as competências daqueles que tinham a responsabilidade de acompanhar o caso, escolheu de não intervir, naquele momento. Após o ato de desconfiança, o Papa, por razões de oportunidade, embora nunca tenha recebido Gotti Tedeschi, tem mantido com ele um contato adequado e discreto.